Uma das eternas questões com que inevitavelmente se confronta quem pretende produzir qualquer coisa de minimamente artístico, ou pelo menos de criativo, é: o que é preferível, produzir muito e se calhar deixar a qualidade um pouco (ou muito) de lado, ou apostar num esforço dedicado à procura de qualidade mesmo que isso signifique que a produção não tem a regularidade que talvez fosse desejável?
Este é um dilema sem resposta. Porque o ideal, produzir muito e bem, é inatingível, e a realidade obriga a chegar-se a alguma forma de compromisso. Porque a procura da maior qualidade possível pode levar à insatisfação permanente com a realidade do que é produzido, e esta à paralisia e à inatividade, e a publicação de qualquer coisa, sem um mínimo de elaboração ou de reflexão prévia, leva quase sempre à irrelevância e à incapacidade de arranjar ou segurar um público. Ora, para cada autor o compromisso está num lugar diferente.
Para Ademir Pascale, autor que além de o ser se multiplica numa miríade de atividades, focadas principalmente na edição de antologias e revistas, parece estar bem mais perto da segunda opção do que da primeira. As três histórias que compõem este O Lado Oculto de Rose podiam ser bastante melhores do que são, bastando por vezes uma revisão atenta para eliminar gralhas e erros de português para já lhes fazer subir a qualidade de forma visível, ainda que talvez não o suficiente para as içar até ao nível de boas histórias. Para isso, faltaria mais uma coisa: reflexão.
Porque a execução de qualquer obra de ficção exige algum tempo de reflexão sobre uma série de detalhes, incluindo a mais importante de todas: aquela que decorre depois de escrever e guardar e antes de recuperar o que está escrito, reler e, idealmente, reformular tudo aquilo que está mal. Porque há sempre coisas que estão mal, e uma leitura atenta depois da história passar algum tempo a marinar na gaveta faz milagres. Às vezes descobre-se que a dinâmica das personagens não faz tanto sentido como se julgava, por vezes é o enredo que precisa de ajustes, outras vezes é a própria escrita que não funciona a contento. E, sem poder saber, naturalmente, se Pascale tem o hábito de deixar as suas histórias a "marinar" durante algum tempo, a ideia que me fica é, intensamente, que não.
Seja qual for o motivo, a verdade é que este livrinho eletrónico é bastante fraco. Das três histórias, só uma chega a ser razoável, e os textos que as acompanham, dois textos curtos sobre dois filmes, também de horror e com uma protagonista chamada "Rose" (ou Rosemary), e um terceiro texto, também curto, sobre a construção do livro, padecem de muitos dos males que atormentam os contos. É neste último texto que fica mais claramente explícita a ideia de que os três contos formam uma sequência, relacionada com "a maldição de Rose", como o autor lhe chama; nos contos propriamente ditos, à parte a repetição do nome, há poucos ou nenhuns sinais de que assim seja.
Em suma: não foi uma boa leitura.
Eis o que achei dos três contos deste livro:
Este livro foi publicado gratuitamente em ebook, mas parece já não estar disponível através da editora. No entanto, continua disponível em vários outros sítios, como o Yumpu.
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