sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Lido: A Mina do Deus Morto (#leiturtugas)

É curioso constatar como por vezes acontece que mesmo depois de se ler um livro inteiro de histórias ambientadas no mesmo universo há detalhes desse universo que só ficam absolutamente claros ao ler uma história posterior, que não está incluída nesse livro. Foi um pouco o que aconteceu comigo e com a série eletropunk do João Barreiros que, depois de alargada a outros autores, deu origem à antologia Lisboa no Ano 2000.

Por isso afirmo: este A Mina do Deus Morto, apesar de ser um conto invulgarmente curto para o que é costume nas ficções do João Barreiros, deve ser lido antes de qualquer outro dos contos pertencentes a esta série, a qual tem dominado a produção ficcional do autor nos últimos anos.

Nele acompanha-se um grupo de mineiros idiotas, controlados por coleiras a que Barreiros chama "coleira conselheira", mas cuja real função não é aconselhar, mas sim dirigir, à força se necessário. Esses mineiros imbecis descem a um profundo poço na Panasqueira e à medida que se vão aproximando da zona de extração do minério vão-se tornando mais inteligentes. Porquê?

Porque, no universo ficcional em que se desenrola a série, um deus (ou algo que na nossa limitada compreensão poderá parecer divino, pelo menos) terá morrido, espalhando pelo universo misteriosas partículas da sua essência, partículas essas que conferem senciência a tudo o que encontrem dotado de algo semelhante a um sistema nervoso. Mas as partículas encontra-se distribuídas pelo espaço de forma irregular, e a Terra atravessa de momento uma área vazia... o que não quer dizer que não tenha antes passado por zonas cheias, com as devidas consequências no enriquecimento de certas camadas geológicas com essas partículas.

E tudo isto, que nas restantes ficções de que se compõe esta série (tanto as de Barreiros como as de outros) se encontra apenas sugerido, aqui está explicitado numa espécie de introdução. De resto, o conto propriamente dito pouco mais é que uma exploração dos efeitos que tem a exposição às partículas do Deus Morto, com umas pinceladas largas a sugerir o resto do universo ficcional que daí decorre. Apesar disso é um bom conto em si mesmo, isto é, sê-lo-ia mesmo que não fosse fundamental para a plena compreensão de uma série de outras histórias.

2 comentários:

  1. Que interessante.
    Uma pena que procurei tais "Contos Digitais" e não os encontrei de imediato.

    No mais, não sei como cheguei neste blog, mas achei bastante interessantes a proposta e análises.

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    1. Sim, os contos foram disponibilizados sob forma de assinatura e já não estão disponíveis de forma legal. Os ficheiros vinham identificados com o email do assinante.

      Suponho que ilegalmente ainda seja possível encontrá-los, que é o que geralmente acontece com os ebooks.

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