domingo, 27 de janeiro de 2019

Lido: A Queda de um Anjo (#leiturtugas)

Enquanto outras literaturas se comprazem com personagens maiores que a vida, a literatura portuguesa parece sentir um particular fascínio por pessoas pequeninas, tratando-as frequentemente com um misto de carinho e condescendência. Aos heróis dos outros contrapomos nós homenzinhos e mulherzinhas com as suas vidinhas comezinhas, não particularmente inteligentes, não particularmente corajosos, não particularmente seja o que for. E isso por vezes corre bem.

Neste A Queda de um Anjo correu bem. Afonso Cruz abre o conto com uma mulherzinha, no céu, a fazer um escândalo porque querem que lá fique sem o marido e ela que não pode ser, que não pode estar sem o seu homem. Aos poucos vamos percebendo que o homem era um sacana de todo o tamanho, mas ela acha que não pode viver (ou seja lá o que fazem as alminhas no céu) sem ele, e antes prefere ir para o inferno se for lá que ele está. As potestades celestiais tentam convencê-la do contrário. Em vão. E por fim resignam-se e deixam-na descer.

Ou cair.

Muito bem escrito, servindo-se da mitologia cristã mas sem cair na previsibilidade comum em tantos outros autores que andam por tais paragens, este é um conto bastante bom, cujo final, razoavelmente surpreendente e bastante forte, o arranca à fantasia pura e simples e o coloca num tipo de fantástico mais próximo da definição avançada por Todorov. Embora ainda me falte ler muitos dos contos desta coleção, julgo que não me enganarei declarando desde já que este será um dos melhores.

4 comentários:

  1. Jorge,

    Ainda é possível encontrar esses contos, para download, nalgum lado?

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    1. Do site do DN desapareceram, já há anos. Se bem me lembro, só estiveram online durante menos de um ano. Entretanto houve quem os pusesse no scribd, mas julgo que ilegalmente.

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  2. Enquanto outras literaturas se comprazem com personagens maiores que a vida, a literatura portuguesa parece sentir um particular fascínio por pessoas pequeninas,

    Agora é que disseste tudo.

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    1. Não acho isso necessariamente mau, atenção. Mas acho que seria porreiro haver mais um pouco de equilíbrio. E de variedade.

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