sábado, 21 de dezembro de 2019

Sapphire Fayer: Princesa dos Dragões

Este é um conto absolutamente adolescente. Não, não é um conto YA, pois estes são regra geral escritos por escritores pelo menos razoavelmente maduros, mesmo quando os temas e as abordagens são adolescentes. Este não. Este é um conto em que a imaturidade é total, começando pelo pseudónimo escolhido pela autora e acabando na história que ela conta, passando por tudo o resto, mas sobretudo, porque é essencial quando se contam histórias por escrito, pela escrita propriamente dita.

Nos tempos em que havia fanzines, contos destes marcavam muitas vezes as estreias de uma porção razoável dos fãs candidatos a escritores, os quais, quando os reliam anos mais tarde, depois de ganharem conhecimentos e experiência, não era raro renegarem-nos. Mas os fanzines praticamente acabaram, não foram substituídos de forma consistente por publicações eletrónicas, ou na verdade por quaisquer outras, e este tipo de coisa acaba por acolher-se em antologias duvidosas. Como esta.

Mas o que escreveu, ao certo, a autora que assina como Sapphire Fayer? O título, Princesa dos Dragões (bibliografia), já dá todas as pistas. É um conto de fantasia carregadinho de dramatismo, sobre a filha adolescente do rei dos dragões, que, como qualquer adolescente caprichosa, revira os olhos a cada palavra ou ato do pai, com o qual viaja até à «ilha dos dragões» onde os dois vão deparar com uma batalha, na qual mergulham e em consequência da qual acontece uma tragédia que a deixa chorosa e resignada com o seu destino régio. Fim. Tudo um bom bocado incoerente e gratuito e escrito num português fracote.

Sim, este conto é mau. Não quer dizer que a pessoa por trás do pseudónimo não possa um dia produzir material realmente interessante, ou até bom — todos começamos por baixo — mas aqui ainda estava a muitos anos disso. Precisava de amadurecer, de ler muito e de escrever bastante para descobrir o que funciona e o que não funciona. Mas escrever e publicar são coisas diferentes. Se é verdade que publicar tem vantagens, não é menos verdade que constitui com frequência um choque demasiado violento com as realidades da opinião pública para quem não está preparado para elas e está ainda longe de ter as suas capacidades aprimoradas, o que leva com frequência à desilusão e esta ao abandono.

Textos anteriores deste livro:

2 comentários:

  1. E daí a importância do beta reading, tão praticado no estrangeiro, que "apara" alguma desta desilusão pública ao ajudar o futuro autor a reconhecer as suas fraquezas e a melhorar. Quando, oh quando, a ideia pegará por cá? Sempre atrasados, nós. E o pior é que, na minha tentativa de divulgar o beta reading por cá, não noto os autores muito interessados, excepto os que conhecem o meio anglo-saxónico e andam a aprender a escrever nele. Os outros não gostam muito da crítica, mesmo construtiva, ou não estão habituados a ela e ainda não desenvolveram a casca grossa para a ouvirem. É como se houvesse esta ideia, por cá, que os escritores já nascem geniais, que tudo o que escrevem é bem escrito desde o primeiro draft, e que ninguém precisa de aprender coisa nenhuma, e que a crítica (especialmente de outros escritores) é "inveja". Esta ideia lá fora faz rir as pessoas. Aqui acha-se que é assim.

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    1. Há muito disso, mas também há outro fator, em especial para os que tentam pelo menos não perder dinheiro com a escrita: o nosso mercado é minúsculo, e cada beta reader será porventura um leitor pagante a menos. Não é certo, mas pelo menos existe esse risco.

      Quando tens tiragens de largas centenas ou milhares, isso é insignificante, mas quando as tuas tiragens são pequeninas deixa de ser.

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