quinta-feira, 6 de fevereiro de 2020

Robert F. Young: Projecto Grande Ascenção

Sim, sim, não é gralha nem me tornei analfabeto agora de repente. O título deste conto, tal como está na revista, é mesmo Projecto Grande Ascenção (bibliografia), e não "ascensão" como devia ser. E também não é gralha no título, porque é assim que está escrito tanto no título, quanto no índice ou no texto do conto. É para ficarmos logo bem situados quanto à qualidade das traduções e revisões que estas revistas continham.

Quanto ao que se esconde por trás deste título gatado, é uma história híbrida de ficção científica e fantasia, com predominância da fantasia. Uma história bastante cínica, que descreve uma greve dos trabalhadores do Projeto Grande Ascensão... hm... Ascenção..., em luta por melhores condições de trabalho. Há elementos de século XX, mas Robert F. Young baralha muito o seu ambiente, enchendo-o de elementos anacrónicos. Na verdade, a base da história é, apesar da existência de greves e de sindicatos, algo de muito semelhante à Torre de Babel, uma construção faraónica, criada porque o rei — que se desloca de liteira, como todos os outros ricos — quer disparar setas contra deus. Ou Yhaweh. Pelo menos é o que se diz à boca pequena entre os trabalhadores.

Mas, e atenção que aí vêm spoilers, vem-se a perceber que os trabalhadores estão a ser manipulados por um "organizador", que incentiva a greve não porque queira de facto a melhoria das condições de trabalho dos trabalhadores, mas porque foi enviado por deus para impedir que o rei alcance o seu intento. Para os fins do organizador, a greve tem sucesso; a empresa responsável pela obra abandona-a, e a torre não se conclui. Para os trabalhadores é que não: não só as suas condições de trabalho não melhoram como ficam sem ele. Eu avisei que o conto era cínico. Cínico e bastante direitolas, apesar da ideologia estar (mal) escondida por trás da ironia. E eficaz, o que é diferente de ser bom, ainda que a tradução seja demasiado má para poder ter grandes certezas sobre a sua qualidade. Há uma coisa, contudo, que não será a tradição que irá alterar: o facto de se tornar demasiado óbvio onde vai levar demasiado depressa. Não há aqui grandes subtilezas. Ou pequenas.

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