segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

Luciano Rodrigues: Alfredo

Há que dizê-lo: entre as duas versões lusófonas da revista americana Fantasy & Science Fiction não existe comparação possível. A brasileira foi muitíssimo melhor, e em tudo, o que ajudará a explicar também a sua durabilidade muito superior. E uma das características mais interessantes que teve foi abrir as suas páginas a autores brasileiros.

Luciano Rodrigues foi um desses autores. Mas foi autor que parece ter aparecido nas páginas do Magazine de Ficção Científica para desaparecer de seguida; eu, pelo menos, desconheço quaisquer outras publicações que ele possa ter feito no âmbito da literatura fantástica. E lendo este conto, Alfredo (bibliografia), não posso dizer que isso me surpreenda.

Trata-se de uma variação com alguma graça do velho mito faustiano. Um tal Duílio vê de repente uma aparição que, segundo vem a compreender em breve, é Alfredo. Isto é: o próprio Diabo. E, sim, adivinharam, este propõe-lhe um negócio. Mas não é bem o negócio que costumamos ver neste tipo de história: aqui, o diabo não quer saber para nada da alma do Fausto de serviço, uma vez que já é dono dela por ação do próprio. O que ele quer em troca de oferecer o mundo ao Duílio é, singelamente, a gratidão do visado.

E assim se vai desenrolando a história, a princípio com a longa explicação das intenções diabólicas, depois narrando o que acontece quando o acordo é posto em prática. Não direi o que é; a única revelação que faço é: não corre bem.

Nota-se, talvez demasiado para uma publicação destas, que as referências de Luciano Rodrigues estão muito afastadas do fantástico e da ficção científica mais assumidamente "de género". Estão muito mais para Goethe ou para Mann do que para Swanwick ou para Pratchett. Isso não piora em nada o seu texto, evidentemente; para alguns o mais provável será melhorá-lo. Mas transforma-o num corpo um pouco estranho nesta publicação.

O que fez com que eu não tenha gostado lá muito deste conto foram principalmente as páginas que o autor levou a engonhar até o seu diabo deitar finalmente cá para fora o que tem em mente, bem como o ar batido que a recuperação de um velhíssimo tema deu à história, mesmo que esta traga consigo alguns elementos de originalidade. Achei-a uma história mediana, ou um pouco melhor que mediana. Interessante e com alguma graça, mas pouco mais.

Contos anteriores desta publicação:

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