Os contos podem tomar muitos aspetos diferentes, chegando mesmo por vezes ao ponto de quase parecerem ser outras coisas. O mais comum dessas aspetos, o mais tradicional, talvez, é o de histórias de narrativa relativamente simples e personagens pouco aprofundadas — pelo menos quando comparamos enredo e personagens com as dos romances — nas quais se explora um conjunto limitado de ideias. Mas também é relativamente comum servirem mais como estudos de personagem do que como histórias propriamente ditas, daquelas movidas a enredo, ainda que para aprofundar uma personagem seja geralmente necessário revelar a sua história, ou pelo menos deixar entrevê-la.
Este Monólogo do Oriente de Patrícia Portela é basicamente um estudo de personagem. Uma personagem que monologa sobre várias coisas, mas sobretudo sobre o oriente. Ou melhor, sobretudo sobre intenções. Sobre vontades. Uma personagem que tem sonhos mirabolantes de viajar para aqui ou para ali, mas há sempre um mas que se interpõe entre o sonho e a viagem. Um mas que tem frequentemente sabor a pretexto, a desculpa destinada a esconder que a vontade de partir e conhecer outras palavras é fundamentalmente teórica e na vida real o comodismo vencerá sempre.
E é um estudo de personagem bem feito. Escrito na primeira pessoa, como bom monólogo que é, o conto depende de uma voz de personagem bem sucedida, e a de Portela é-o, com um uso bastante bom das características orais do discurso. Claro: é daquelas histórias que não vão a lado nenhum, mas até isso contribui para sublinhar a natureza do protagonista/narrador, que também ele não vai a lado nenhum, por mais que fale em ir. Nunca. É um bom conto, portanto. A ponto de até eu ter gostado, eu que costumo achar chatos os contos com gente chata, e este tipo é um chato de primeira. Era capaz de dar uma ótima personagem secundária num texto mas extenso, daquelas que funcionam simultaneamente como inspiração para a ação e amarras contra ela. Protagonista é que não: é demasiado chato.
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