quarta-feira, 28 de agosto de 2019

E. M. Forster: O Obelisco

É sempre uma complicação escrever sobre contos que dependem de um final surpreendente que obriga a reavaliar o que ficou para trás, ao mesmo tempo que se tenta não dar demasiadas pistas a quem lê sobre qual a surpresa que existe nesse final para não lhes estragar a experiência de uma eventual leitura. Mas torna-se ainda mais complicado fazer isso quando a surpresa está tão entrelaçada com quem o autor é (ou era, vá) como acontece neste conto.

E até a frase anterior já deixa várias pistas a todos os que já conhecerem alguma coisa sobre E. M. Forster e a sua obra. Assim, valerá a pena tentar manter o jogo relativamente escondido? Ou mais vale abri-lo de uma vez?

Bem, vou entreabri-lo. Porque tem de ser. Todos os que conhecem Forster saberão não só que ele era homossexual, mas que escrevia com certa frequência sobre temas homossexuais. Ora, neste O Obelisco parece a princípio não o fazer. O conto é sobre um casal heterossexual invulgar, pois o homem do casal é anão. Em férias longe de casa, param numa terra onde um obelisco erguido nas falésias junto ao mar é uma das principais atrações turísticas da região. Aí, conhecem fortuitamente dois marinheiros de licença, um dos quais, obtuso, grande e musculoso, tem a irónica alcunha de "Tiny", "minúsculo".

No meio de uma névoa de recriminações e frustrações, pois nenhuma das personagens neste conto é realmente simpática e muito menos feliz, o casal sai da vila rumo ao tal obelisco, porque há que se ver as atrações turísticas quando se é turista. Depressa, no entanto, os marinheiros se lhes juntam, e após alguma conversa os quatro decidem seguir juntos até ao obelisco. Mas não demoram a formar-se dois grupos, um que a narrativa continua a seguir, pois apesar de contado na terceira pessoa o ponto de vista do conto é sempre o da mulher, e outro que perde de vista. No primeiro, está a mulher e o mais educado dos dois marinheiros; no segundo, o anão e "Tiny".

Isolada do marido, sexualmente frustrada e envaidecida pelas atenções que lhe são prestadas pelo marinheiro, a mulher deixa-se seduzir. E os dois afastam-se do caminho e entregam-se a uma cópula clandestina no meio do campo. E o conto prossegue com essa infidelidade a servir de mote às dúvidas, vergonhas, desafios, temores e inseguranças da mulher, enquanto o marinheiro tenta sossegá-la, que ele se encarregará de não deixar que ninguém suspeite de nada quando reencontrarem os companheiros. E é o que acontece até chegar o final surpresa sob a forma de um postal que representa o obelisco e das palavras que são trocadas a respeito do postal e do que ele representa.

Este é mais um dos tais contos em que eu acabo a leitura com um considerável respeito pelo autor e a sua habilidade narrativa, mas essencialmente aborrecido. O conto é bom, mas daí até eu ter gostado dele vai alguma distância. Em termos de gosto pessoal, esta leitura termina com um "meh".

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