terça-feira, 6 de agosto de 2019

Italo Calvino: Duas Histórias em que nos Procuramos e nos Perdemos

Não sei se é pela acumulação de álcool nos organismos dos convivas à medida que a noite na taberna avança, isto é, não sei se Italo Calvino ordenou as suas histórias como as ordenou com essa ideia em mente (parece-me provável: ele era um escritor muitíssimo rigoroso, e esse é o tipo de pormenor que me parece ajustar-se inteiramente à personagem), mas o facto é que à medida que esta parte do livro avança aumenta também a confusão e desordem nas histórias que vão sendo contadas.

Prova disso é este conto, adequadamente intitulado Duas Histórias em que nos Procuramos e nos Perdemos, que conta como dois dos convivas da taberna competem para contar a história de cada um, recorrendo às mesmas cartas que o outro usa. Isto à superfície. Cavando mais fundo, o que Calvino na verdade aqui faz é uma reflexão altamente erudita sobre a natureza das histórias enquanto estruturas combinatórias de elementos mais ou menos discretos e comuns, na qual equipara e compara duas velhas lendas e os respetivos protagonistas: Fausto e as duas ambições alquímicas e Parsifal e a sua demanda do Graal.

O resultado é bastante confuso, no sentido de que o leitor distraído facilmente poderá perder-se no labirinto que Calvino monta. Não é um conto fácil, longe disso, e será tanto mais recompensador quanto melhor o leitor conhecer as lendas que lhe servem de inspiração, o que de resto também se pode dizer de várias das histórias anteriores. Eu, que não as conheço particularmente bem — ou por outra, a de Fausto conheço razoavelmente bem, pelo menos em algumas das suas muitas versões, mas a de Parsifal não — não me senti lá muito recompensado. Salvo pela escrita de Calvino, que essa é tão boa como sempre.

Contos anteriores deste livro:

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