sábado, 16 de novembro de 2019

Vítor Gil Cardeira: O Amor é uma Fuga sem Fim

Se há coisa que me aborrece enquanto leitor é deparar com um escritor que subestima a minha inteligência, explicando coisas que não precisam de qualquer espécie de explicação. E Vítor Gil Cardeira cometeu esse pecado, ao arrancar este seu conto, apesar de o próprio título de O Amor é uma Fuga sem Fim (bibliografia) já ser em boa medida explicativo, com uma nota em que explica que "esta estória [que] vos parecerá ter lugar fora do tempo [...] está enraizada nos dias que se colam a quem não sabe que os mais dilacerantes momentos são os que nos trazem as maiores alegrias [...]", que é como quem diz, em parte, "não liguem, que isto parece fantástico mas é no fundo baseado na realidade". Só dá vontade de perguntar: "tá bem, Vítor, e qual é o conto fantástico que não o é?"

Irritações à parte, o conto é engraçado. Cardeira parece ter decidido brincar um pouco com o conceito de sexo dos anjos e escreveu um conto com um anjo como protagonista. Mas não um anjo qualquer: um anjo que, ao contrário dos demais, nasceu, e ainda por cima defeituoso, só com uma asa, e por isso é atormentado pelos outros anjos lá no céu coisa que, convenhamos, não é lá muito angélica. De tal forma que decide vir-se embora e transformar-se em homem. Seguem-se aventuras várias, incluindo o amor e a fuga sem fim.

Mas o conto seria mais engraçado sem o pendor que Cardeira demonstra para a divagação. É frequente interromper o fluxo narrativo para se perder em elucubrações laterais à história e em frases de efeito, cujo efeito principal é afastar o leitor da história que está a contar. É um estilo, suponho; há quem goste de coisas escritas assim, palavrosa e arrebicadamente. Mas eu não sou uma dessas pessoas; a forma, para mim, deve estar ao serviço do conteúdo. Quando se lhe começa a sobrepor, temos um problema. Foi o que aconteceu aqui: o conto, que tinha tudo para ser muito interessante, tornou-se a espaços aborrecido. E foi por isso que este conto não me pareceu tão bom como tinha potencial para ser. É um conto entre o razoável e o bom menos, em parte salvo pela ironia, com uma ideia de base muito interessante, mas cuja execução deixou algo a desejar.

Contos anteriores deste livro:

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