segunda-feira, 11 de novembro de 2019

Ana Pessoa: Os Crimes de Agnieszka

Ana Pessoa escreve francamente bem. Mais importante do que isso, talvez, é Ana Pessoa escrever de uma forma interessante, salpicando o seu texto de pormenores inesperados, pois há muitos autores que escrevem bem, por vezes até bastante melhor que ela, mas de uma forma bem mais aborrecida. E é essa a explicação, creio, para eu ter gostado tanto deste conto, apesar do tema ser daqueles que pouco interesse costumam despertar-me.

Os Crimes de Agnieszka são os crimes de uma polaca, casada com um português e há já bastantes anos a viver em Portugal, a qual ganha a vida como mulher-a-dias. E crimes, aqui, levam aspas, pois nada existe de verdadeiramente criminal na situação. Os crimes dela só são crimes aos olhos da moral vigente. Há neles algumas ressonâncias do Crime do Padre Amaro, mas são ténues, pois os crimes deste estavam bastante mais próximos dos crimes verdadeiros mesmo sendo o fundo da história igualmente moral.

Agnieszka limita-se a fazer algo que, segundo rezam as histórias, as criadas e mulheres-a-dias fizeram desde tempos imemoriais, seja por iniciativa sua, seja por iniciativa alheia: iniciar sexualmente o filho do patrão. E fá-lo por iniciativa sua, e repetidamente, o que não encara como crime algum, bem pelo contrário. O crime é ser apanhada. É por isso que foge, se vai embora, deixa a vida, o marido e Portugal para trás, recupera a liberdade.

Uma história banal, dizem? Pois é. Mas escrita tão bem, tão invulgarmente, que não me aborreceu. Ana Pessoa mereceria que eu lhe tirasse o chapéu, se usasse tal coisa.

Contos anteriores deste livro:

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