quinta-feira, 13 de junho de 2019

Fernão Mendes Pinto: E Tais Pancadas Tem a Costa da China

Toda a gente tem lacunas na sua cultura geral e eu, evidentemente, não sou nenhuma exceção. Há livros que apesar de há muito tempo me despertarem curiosidade, por um motivo ou por outro ainda não li, e alguns desses livros são daqueles clássicos que toda a gente devia ler (outros são clássicos mais privados, e outros não são nem uma coisa nem a outra). Um desses livros é a Peregrinação de Fernão Mendes Pinto.

Pois bem: já não me falta tudo. É que este E Tais Pancadas tem a Costa da China, um dos livrinhos genericamente dedicados ao mar publicados pela Expo'98, é um excerto da Peregrinação. Não em versão original, mas numa versão de Maria Alberta Menéres, ainda que esta se pareça ter limitado a transportar o português quinhentista de Fernão Mendes Pinto para os nossos dias.

Não sei, naturalmente, até que ponto este texto é representativo da Peregrinação como um todo, ainda que por algumas coisas que tenho lido por aí (principalmente antes de ler isto) até parece sê-lo bastante. Relato de viagens e aventuras, este livrinho descreve vários episódios de conflitos, batalhas, tempestades, raptos, saques e resgates levados a cabo por uma frota portuguesa, tripulada em parte por povos aliados, em vários pontos das costas chinesas. Se todo o livro de Fernão Mendes Pinto for assim, será decerto muitíssimo interessante.

Por isso, creio eu, enquanto estava a ler as páginas desta publicação fui sendo repetidamente assaltado por uma interrogação: por que estranho motivo, havendo este material de base e um manancial de outras grandes aventuras marítimas, quer nos sisudos livros de história, quer em páginas de enciclopédias e noutro material de divulgação mais genérico, praticamente não existe em Portugal uma tradição de literatura de aventuras em terras exóticas? Semelhante à que existe no Reino Unido ou em França? Material, decididamente, não nos falta; na verdade até temos um período mais amplo do que eles para explorar. Portanto por que raios nunca o explorámos?!

Não tenho resposta para isto. Mas é bem possível que as razões sejam as mesmas que levaram à quase inexistência de outras formas de contar histórias mais centradas no enredo do que na forma literária ou na exploração intimista (ou umbiguista) da psicologia das personagens, como a ficção científica ou a fantasia. O certo é que por este exemplo já fica claro que Fernão Mendes Pinto sabia juntar as duas coisas, enredo e forma, o que só aumenta a perplexidade por tão poucos outros autores terem tentado fazer o mesmo. Depois de o ler, fiquei com mais vontade de ler mesmo a Peregrinação. Este é um bom livrinho.

Este livro foi disponibilizado gratuitamente em PDF pelo Instituto Camões e pode ser descarregado, por exemplo, daqui. (Os restantes volumes da coleção estão acessíveis neste link).

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