A ficção científica sempre foi demasiado otimista quanto ao desenvolvimento das viagens espaciais, sobrestimando a capacidade da tecnologia para ultrapassar os obstáculos e a vontade política e económica para o fazer e subestimando as dificuldades desse tipo de empreendimento e, tantas vezes, a mera dimensão das distâncias envolvidas em qualquer voo que não se limite às vizinhanças da Terra.
Assim, é há muito dado adquirido na FC que após as primeiras missões robóticas de Marte se seguiriam inevitável e brevemente missões tripuladas. Mas que encontrariam ao chegar lá? Gregory Benford dá aqui uma resposta possível.
E não, apesar do título deste conto ser Toda a Cerveja de Marte (bibliografia), não é cerveja. É vida.
Todo o conto se desenrola no interior de uma espécie de tanque pressurizado, tripulado por um pequeno grupo de exploradores cuja função é investigar a origem e natureza dos equívocos resultados obtidos pelas sondas automáticas quanto à presença de moléculas orgânicas no solo marciano. De notar que na época em que foi escrito estas eram apenas sondas estáticas, pois ainda não se tinha chegado à época dos rovers. Assim, parte do enredo está desatualizado devido à grande quantidade de ciência marciana produzida desde os anos 80. Mas esse facto não anula a possibilidade de algo de semelhante ao que aqui se descreve poder vir a acontecer.
É uma missão tensa na zona do Vallis Marineris. Os tripulantes têm opiniões diferentes quanto ao rumo ideal a seguir e a discórdia só se exacerba à medida que os dias passam e não encontram nada. Mas depois encontram. E quanto mais avançam, mais encontram. Há vida em Marte, ou pelo menos numa região limitada de Marte. E o conto termina quando se descobre a sua origem.
Este é daqueles contos de FC hard nos quais as questões técnicas e puramente científicas têm preponderância sobre o resto. Nem toda a FC hard é assim, e eu prefiro quando não é, como no caso do romance Blindsight do Peter Watts que comentei por aqui há pouco tempo. Na verdade é mais do que preferência: tenho chegado à conclusão de que a que não é assim, isto é, aquela que vai mais fundo nos dilemas humanos do que a que se dedica sobretudo a explorar problemas científicos e tecnológicos, tem tendência a envelhecer melhor. Mas isto não quer dizer que ache este conto mau. Não o é, pelo contrário. É um conto bastante interessante sobre as consequências involuntárias do que fazemos ou do que não fazemos. Ou da ignorância.
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