segunda-feira, 18 de março de 2019

Lido: Contos Populares Portugueses (#leiturtugas)

Termina aqui aquela que deve ser a mais longa série de posts da história da Lâmpada, iniciada em janeiro de 2016. Andei à volta deste livro durante três anos, lendo um conto agora, outro uns dias depois, outro passada mais uma semana, etc.

(ou talvez não; a da Antologia do Humor Português talvez tenha sido ainda mais longa)

Estes Contos Populares Portugueses são histórias que Adolfo Coelho foi recolhendo pelo país, sobretudo acima do Mondego, e publicou em 1879. Na época, este tipo de recolha estava na moda pela Europa fora e esta de Adolfo Coelho não foi a única que se fez em Portugal. Ainda hoje se fazem, de resto, surgindo de vez em quando uma nova edição de histórias tradicionais, mais ou menos completa, feita com maior ou menor rigor, mais ou menos restrita geograficamente. Algumas são autênticos monumentos bibliográficos, com centenas e centenas de páginas; esta, apesar da grante quantidade de histórias que contém (75), cabe num livro de bolso de 290, número em que se incluem 75 páginas de textos introdutórios.

Enquanto lia os primeiros contos, estava na dúvida sobre que tipo de abordagem teria seguido Adolfo Coelho. Seria a dos Irmãos Grimm e outros autores, que adaptavam as histórias recolhidas conforme achassem melhor, chegando por vezes ao ponto de fundir numa só histórias díspares? Ou seria uma abordagem mais científica e mais moderna, de recolha etnográfica propriamente dita, em que há a preocupação de preservar tanto quanto for possível tudo o que de genuíno as histórias tradicionais trazem consigo?

Quando acabei de ler o livro, e embora não possa garantir que Adolfo Coelho nunca introduziu nestas histórias nada de sua lavra, fechei-o convicto de que a sua abordagem foi básica, se não unicamente, a segunda. Estas histórias, parece-me, são demasiado díspares, em estilo e em qualidade literária (por vezes muito má), e existem demasiadas coincidências nesse estilo e qualidade entre diversas histórias recolhidas no mesmo sítio e, presumivelmente, junto do mesmo contador, para que o compilador as tenha adulterado com melhoramentos ou fusões. E isso, a meu ver, é uma qualidade.

Por outro lado, parece-me haver aqui alguma insegurança no conceito de conto popular. O que é um conto popular, ao certo? Uma história que algum membro do povo conta, seja qual for, e qualquer que seja o seu tema, abordagem ou antiguidade? Ou uma história transmitida ao longo de gerações, ganhando com o tempo tons de lenda?

Adolfo Coelho parece seguir a primeira abordagem. Além de histórias populares propriamente ditas, encontram-se aqui autênticas anedotas, bem como histórias daquelas que qualquer pessoa conta aos amigos na base do não-queiras-saber-o-que-aconteceu-a-um-amigo-meu. Este tipo de história tende a concentrar-se no fim do volume, talvez porque, e atenção que isto é especulação pura, o compilador tenha achado que precisava, para compor o volume, de mais material do que as histórias tradicionais de que dispunha. Isso, a meu ver, diminui-o, mas não o suficiente para que perca o interesse. É um livro interessante, ainda que esse interesse seja com frequência bastante mais sociológico que literário, e mesmo quando o que revela sobre a psique popular de meados do século XIX não é propriamente positivo.

Eis o que fui pensando sobre cada história:
Este livro foi comprado.

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