segunda-feira, 25 de maio de 2020

Isaac Asimov: Uma Questão de Princípio

E de vez em quando as ironias corrosivas de Isaac Asimov conseguem acertar bastante bem nos alvos. Em Uma Questão de Princípio (bibliografia), o alvo é o meio literário, ou por outra, um certo conjunto de pessoas que, segundo diz, sonham ser escritores mas por algum motivo não conseguem. Por algum motivo é força de expressão: eles sabem precisamente porquê. Geralmente o culpado é o emprego, esse ladrão de tempo que por sua vontade seria melhor gasto a produzir arte literária. Conheço bem o tipo; na verdade, ao longo de vastos períodos da minha vida fiz parte dele. Pelo menos parcialmente.

É um destes que o homem que controla o demoniozinho Azazel vai aqui tentar ajudar. Desinteressadamente, claro, porque o dinheiro que o outro lhe promete, parte dos ganhos que antevê caso chegue a ser um escritor famoso, é um mero pormenor. E o Azazel lá lhe corta uns nós que o estavam a impedir de usar as palavras a contento, e o homem lá começa finalmente a conseguir escrever decentemente. Tudo bem, certo? Temos novo escritor de primeira água no mercado, não é?

Claro que não. O homem era publicitário, aquela profissão desprezível que muito o desgostava e da qual desejava libertar-se para melhor se dedicar à literatura. Mas com os cortes que o Azazel faz consegue pela primeira vez usar o talento recém-desbloqueado para melhor vender desodorizantes. Ou seja: tem pela primeira vez sucesso como publicitário. Ora, com o sucesso vem um aumento salarial. E com um aumento salarial... literatura? Que é isso?

Um dos problemas que encontro nestes contos do Azazel é a ironia não funcionar. Seja por se tornar repetitiva, seja por estarmos numa época diferente, seja por questões relacionadas com a personalidade do próprio Asimov, seja por alguma incompatibilidade com o meu sentido de humor, seja pelo que seja. Mas nesta história funciona. Por isso, apesar de ser uma história tão formulaica como a maior parte das outras, gostei mais dela.

Contos anteriores deste livro:

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